Resumo
Este artigo explora a evolução das leis de cidadania italiana, destacando as mudanças nas regras de aquisição e transmissão da cidadania desde a Lei n.º 555 de 1912 até a Lei n.º 91 de 1992. Analisamos as implicações dessas mudanças para os descendentes de italianos no exterior, com foco no impacto do princípio jus sanguinis e nas modificações sobre a cidadania por descendência. A abordagem histórica busca esclarecer as interpretações jurídicas ao longo do século XX e como elas refletem transformações políticas e sociais na Itália.
1. Introdução
A cidadania italiana é um tema relevante para milhões de descendentes de italianos em todo o mundo, especialmente em países que receberam grande número de imigrantes italianos, como o Brasil. A legislação sobre a cidadania italiana foi estabelecida com base em diferentes contextos políticos e sociais, refletindo as realidades de cada época. Este artigo examina a evolução histórica da legislação italiana, focando nas principais leis e nas mudanças significativas que afetaram o reconhecimento da cidadania italiana por descendência.
2. A Lei n.º 555 de 1912: Primeira Estrutura para a Cidadania Italiana por Descendência
A Lei n.º 555, promulgada em 13 de junho de 1912, foi a primeira legislação a regulamentar a cidadania italiana. Com base no princípio do jus sanguinis (direito de sangue), essa lei permitiu que a cidadania fosse transmitida de pai para filho, independentemente do local de nascimento. Isso foi crucial em um contexto de intensa emigração, no qual muitos italianos buscavam melhores condições de vida em países como o Brasil e os Estados Unidos.
Principais pontos da Lei n.º 555 de 1912:
- Transmissão da cidadania pelo pai: A cidadania era transmitida apenas pela linha paterna. Mulheres italianas que se casavam com estrangeiros perdiam a nacionalidade italiana, conforme o Código Civil vigente na época.
- Naturalização e perda de cidadania: A lei estabelecia que italianos que se naturalizassem em outro país perdiam a cidadania italiana e, consequentemente, a capacidade de transmiti-la a seus filhos. Esse fator impactou especialmente as comunidades italianas nos países de destino, onde era comum a naturalização.
A Lei n.º 555 teve consequências significativas para as gerações futuras, pois muitos italianos que migraram optaram por naturalizar-se nos países de acolhimento, o que interrompia a linha de transmissão da cidadania para os descendentes.
3. A Constituição Italiana de 1948 e o Reconhecimento dos Direitos das Mulheres
Com o fim da Segunda Guerra Mundial e a queda do regime fascista, a Itália adotou uma nova Constituição em 1948, trazendo uma série de reformas progressistas, incluindo o reconhecimento da igualdade de gênero. Esse novo marco constitucional trouxe impacto para a cidadania, pois aboliu formalmente a perda automática da cidadania italiana por mulheres que se casavam com estrangeiros.
Embora a Constituição de 1948 tenha assegurado direitos iguais entre homens e mulheres, a cidadania italiana por descendência continuou a ser transmitida apenas pela linha paterna em casos ocorridos antes de 1948, levando à formação da chamada “Sentença de 1948” nos tribunais italianos. Esta sentença judicial passou a permitir que descendentes de mulheres italianas casadas com estrangeiros antes de 1948 também pudessem reivindicar a cidadania italiana por via judicial, corrigindo assim uma injustiça histórica.
4. A Lei n.º 91 de 1992: Modernização da Legislação sobre a Cidadania Italiana
A Lei n.º 91, promulgada em 5 de fevereiro de 1992, marcou uma mudança significativa na legislação sobre cidadania italiana. Esta nova lei modernizou as disposições anteriores, permitindo uma abordagem mais inclusiva e flexível para o reconhecimento da cidadania italiana.
Principais mudanças introduzidas pela Lei n.º 91 de 1992:
- Reconhecimento da cidadania pela linha materna: A lei oficializou o direito de transmitir a cidadania pela linha materna, consolidando as decisões judiciais anteriores e garantindo o direito à cidadania por descendência em ambos os lados da família.
- Dupla cidadania: A Lei n.º 91 de 1992 permitiu a dupla cidadania, abolindo a regra que previa a perda automática da cidadania italiana em caso de naturalização em outro país.
- Aquisição da cidadania por nascimento e adoção: A cidadania italiana passou a ser concedida automaticamente a filhos de pais italianos, independentemente de onde tenham nascido. A lei também incluiu disposições específicas para o reconhecimento da cidadania em casos de adoção.
A Lei n.º 91 representa um marco por ter corrigido lacunas e desigualdades da legislação anterior, ampliando o direito dos descendentes de italianos a reivindicar sua cidadania.
5. Conclusão
A evolução das leis de cidadania italiana, desde a Lei n.º 555 de 1912 até a Lei n.º 91 de 1992, reflete mudanças profundas na sociedade italiana e seu relacionamento com a diáspora. As reformas legislativas acompanharam os avanços na luta pela igualdade de gênero e o reconhecimento do direito à dupla cidadania, fortalecendo os laços entre a Itália e os descendentes de italianos ao redor do mundo.
Referências
- Italia. Legge 13 giugno 1912, n. 555 – Sulla cittadinanza italiana. Disponível em: https://www.normattiva.it. Acesso em: 02 nov. 2024.
- Italia. Costituzione della Repubblica Italiana, 1948. Disponível em: https://www.senato.it/documenti/repository/istituzione/costituzione.pdf. Acesso em: 02 nov. 2024.
- Italia. Legge 5 febbraio 1992, n. 91 – Nuove norme sulla cittadinanza. Disponível em: https://www.normattiva.it. Acesso em: 02 nov. 2024.
- Micheli, M. Il diritto alla cittadinanza italiana e le sue evoluzioni storiche. Revista di Diritto Pubblico, v. 21, p. 15-29, 2019.